O que há de Deus
Que de entrega, que de alívio,
Te interfere a culpa de sentir-se vivo,
E de gozar, sombrio, as próprias entranhas
Que há, senhor deus,
De tanto desequilíbrio, entre Mim e o próximo,
Que eu não possa ou não deva.
Mas que a ele, por ele, me sacrifique
O que há de tanto desejo,
De tanta busca e promessas,
De compensar essa mísera existência.
Altares de homenagens, por simplesmente respirar
O que há?
De não contemplar o que se sente na carne,
De se envergonhar do próprio corpo,
templo de nós mesmos,
Para louvar a um alheio etéreo e ilusório
Quem lhe comanda na terra?
Como se apropria de palavras tão promíscuas,
Que, re-interpretadas, tantas e tantas vezes,
Justificam o amor, o ódio...
Mas nunca a dúvida, o talvez.
É uma prece a mim mesma,
Um lento rosno de vitórias estendidas
Sem se habituar a engrandecer o louco, o profano,
O umbigo e seu desnível em direção ao tudo,
Em relação ao nada.
Romper o véu da soberania desleixada,
que honrar uma palavra vazia de rosto, altiva de nome
estatizou no cumprimento de uma ordem.
O que há de desordem?
E se nada houver de ordem?
Se nada houver de se louvar,
de se culpar, de se agradecer, de se engrandecer,
eu caio de joelhos nessa terra, encaro a solidão do universo,
e rezo desmedidamente, crente,
no poder da minha própria palavra.
Amém.
Mari Brasil
2 comentários:
Quanto tempo não entrava aqui para contemplar suas profecias... como sempre esculpindo palácios e catedrais de palavras!
bjs
Belíssimas catedrais... palavras e imagens que se entrelaçam como um vitral.
Lindo e intenso!
Postar um comentário